CAMINHÃO DE BOI [era assim]
Nóis sentava in quarqué barranco lá no tope e ficava assistino. Asveiz pruveitava pra mastigá argum talim de capim c’a gente rancava do pé (do pé de capim) e saía fresquim... tinha uns até mei doce... nem todos... de certo num ia fazê mal’, purque as vaca cumia...
O caminhão ia subino, lá do ôto lado, chei de boi dento... Nóis num via os boi não, tava longe... sabia que tinha boi nos caminhão quand’êlz tava na subida. Claro que, primero, o caminhão tinha discido; mais isso eu num lembro, acho que é purque pra baxo todo santo ajuda... passava dispircibido. Ô tamém, pode sê que a remessa intera dos caminhão discia tudo primero, até lá no imbarcadô, e só dipois cumeçava a subi chei. E aí, quando nóis cumeçava iscutá barui e ia lá pro tope pra vê... já que só dava pra iscutá de longe quando tava na subida... intão num fartava nenhum pra descê. Dicerto era isso, purque, pensa bem: s’êlz topasse naquela istradinha istreitinha, ridicada, antes de chegá lá na istrada da Pedra Branca, ia sê custoso dimais da conta... um teno que dá passage pu ôto... arriscano tombá de fora da istrada.
O caminhão ia subino pela istradinha, balançano a carroceria, e a gente iscutano o barui... Quando chegava na subida mais forte, urrava mais, eu lembro direitim. Aí, tinha uns que consiguia subi mais face, ôtos cum munto custo, e ôtos cabava incravano. Quando incravava, asveiz ia pelejano até saí; ôtas veiz, quanto mais pelejava mais atolava. Nóis ficava tentano adivinhá qual’ que ia incravá... de veiz in quando até apostava... aposta valeno nada, quais sempre, só pra sabê quem ganhava... ô, quando munto, um trem quarqué que tinha jeito de consigui... uma manga sabina, purexemplo... uma mixirica temporona...
Quando incravava pra valê, tinha que vim cons boi de carro, cangado, pra puxá e disincravá – esses boi era d’ôta qualidade... diferente dos que ia nos caminhão... purque boi tamém, igual’ gente, tem diferença dimais uns dos ôto, cumé que passa a vida... seno boi, dicide logo pra quê que vai sirvi... Porque, pur exemplo, ninguém é besta de querê amansá boi nelor, pô canga n’êlz, porque é brabo dimais; esses é pra ingordá e matá. Já, cum gente, num dá pra separá face assim não, purque as pessoa inventa e disinventa munto... umas mais que as ôta... aí o povo pensa que um vai virá uma coisa e vira ôta.
Face num era, disincravá qu’êl trem pesado... mais cabava dano certo. Num sei se arguma veiz teve que arrumá um jeito dos boi descê do caminhão pra manerá. Num lembro. E tamém num quer dizê que nóis pudia ficá isperano contecê tudo... dava a hora que tinha que i imbora, seja por causa da iscola, ô apartá vaca... tratá de porco... ô pro meu pai num ficá incomodado (meu pai é modo de falá, purque num era pai só meu não).
Tinha caminhão azul’, vermei, marelo... isso as gabina, porque as carroceria custumava sê de cor misturada. De longe num dava pra vê direito as cor que tinha na carroceria, só mais ô meno, mais nóis já tinha visto desses caminhão de perto, lá na rodovia, quando tava isperano o ônibus, que arguns chamava de jardinera... e tamém na cidade. E o Bejim falava que quiria comprá um. Na verdade, ele nunca teve (nem vai tê mais) nem caminhão de brinquedo; pelo menos dos comprado, qu’eu subesse. Ele mesmo fazia uns brinquedo, cuns pauzim, manguinha... fazia curralzim, vaquinha... num lembro d’ele fazê caminhãozim não. Mais tamém, eu num lembrá num quer dizê nada...
Quarqué um sabia que os boi que os caminhão levava era pra matá... Todo mundo sabia c’aquel’z boi, lá do dotor Fausto, era de corte. Mais nóis num ficava pensano nisso quando ia vê os caminhão subi lá na istrada... era bão ficá veno. Inda mais que os boi era isquizito mesmo, munto diferente dos ôto (nóis nem num tinha boi, só um marruaiz e as vaca - e bizerro, claro)... o tii Fiico tinha boi de carro, arguns vizim tinha...). Os boi do dotor Fausto era nelor: uns boi ispantado, arisco... e tudo branco, tudo igual: a cara dum, o fucim do ôto.
Falá verdade, pra nóis, sentado lá no tope, oiano os caminhão subi no otro tope, era cumo se num ixistisse os boi: só os caminhão.
(Florisa Brito)
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